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quinta-feira, setembro 26, 2024

 

FIM DO FLAGELO DE BOTAFOGO


1)      BACIA HIDROGRÁFICA DE BOTAFOGO

A bacia hidrográfica de Botafogo é constituída por dois rios principais: o Berquó e o Banana Podre, ambos com vários afluentes menores.

O nome Berquó deriva de uma família com origem na Ilha Terceira, pertencente ao arquipélago dos Açores, no último quartel do século XVII, de lá passando para a Ilha de Faial, do mesmo arquipélago. Quando da transferência da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, alguns membros da família vieram juntos, colocando-se posteriormente a serviço do Império. Um dos gentis homens dessa família possuía uma chácara no local onde em 1852 foi inaugurado o Cemitério São João Batista. Ela se chamava Chácara Berquó, e o rio que a atravessava acabou sendo conhecido pelo nome de rio Berquó.  

Na primeira metade do século XIX Botafogo já dispunha de vários caminhos, sendo um deles chamado de Caminho do Berquó, talvez por seguir o curso do rio homônimo. Esse caminho foi em 1870 renomeado para rua General Polidoro, em homenagem a Polidoro Quintanilha Fonseca Jordão, que prestou incontáveis serviços ao Império.

O rio Berquó nascia límpido na atual rua Viúva Lacerda, na encosta do Corcovado, e descia ao longo do tal Caminho do Berquó até desaguar na enseada de Botafogo, aproximadamente onde há atualmente a sede náutica do clube Botafogo, com vários pontilhões destinados à travessia de pedestres.

Já o Banana Podre nasce nas encostas do maciço do Corcovado e recebe contribuições de rios das ruas Icatu e do morro Dona Marta. Tinha curso sinuoso e corria pela parte traseira das casas da rua São Clemente, desviando depois para a esquerda, cruzando a rua Marquês de Olinda e desaguando na enseada de Botafogo.

Tanto ele quanto o Berquó eram navegáveis por canoas de reduzido tamanho na época chuvosa, sendo o Berquó usado como meio de acesso às glebas nas vizinhanças da Lagoa de Sacopenapã (Rodrigo de Freitas).  

O mapa abaixo mostra de maneira um tanto precária os cursos do Berquó e do Banana Podre. Notem como havia muitas áreas de charcos, como de resto era comum no Rio de Janeiro de outrora, inclusive nas áreas centrais.

 

2)      O FLAGELO DAS ENCHENTES

No início do século XIX a Princesa Carlota Joaquina, esposa de D. João VI, se recusou a morar com o marido e mandou construir um palacete no início do Caminho Novo de Botafogo (atual rua Marquês de Abrantes), atraindo a atenção para a região e iniciando a ocupação efetiva do bairro. Novas ruas foram abertas, a população aumentou, porém na época das chuvas havia o sério problema das enchentes.

Essas proverbiais enchentes, que durante decênios frequentemente ocorriam, eram resultado do transbordamento dos rios Berquó e Banana Podre, que transformavam os precários caminhos e ruas do bairro em autênticos charcos na época das chuvas, pois recebiam os afluentes de transversais das atuais ruas General Polidoro, Voluntários da Pátria, São Clemente e Mena Barreto, além das encostas do Corcovado. A parte final da rua Marquês de Olinda, por exemplo, ficava isolada quando o Banana Podre transbordava.

 

3)      PRIMEIRA TENTATIVA DE SOLUÇÃO

Na gestão Pereira Passos (1902 – 1906) ambos os rios foram canalizados, passando a correr dentro de canais subterrâneos de concreto, desaguando na praia de Botafogo, em locais diferentes. Mas as enchentes não tardaram a voltar, em virtude do grande volume d’água que fluía para os citados canais, agora aumentado pela ocupação humana do bairro, que diminuiu a cobertura natural do solo e consequentemente a capacidade de absorção das águas das chuvas.

 

4)      A SOLUÇÃO DEFINITIVA

Em 1963, durante o governo Carlos Lacerda, a SURSAN (Superintendência de Urbanização e Saneamento) resolveu dar fim ao problema das enchentes construindo uma série de grandes obras no bairro: o rio Berquó e o Banana Podre passariam a correr dentro de galerias subterrâneas maiores e uma galeria dita de cintura seria construída ao longo da avenida das Nações Unidas, captando as águas de ambos os rios e as conduzindo a um ponto de descarga na enseada de Botafogo, próximo à sede náutica do clube homônimo.

Juntamente com essas obras gigantescas também foi feita nova linha de esgotos paralela à galeria do Berquó, conectando-a a uma linha já existente na Praia de Botafogo, perto do local da antiga estátua do Manequinho, daí sendo levado para uma elevatória e encaminhado para o interceptor oceânico, para descarga no mar, na altura de Ipanema.

Eu tive a oportunidade de trabalhar na companhia vencedora da concorrência para a construção da galeria do Berquó e da linha de esgotos que a acompanhava. A companhia se chamava CINCO S.A. – Comércio, Indústria e Construções.

Nos próximos itens descreverei o desenrolar dessa obra.

 

5)      OS PREPARATIVOS

As notícias de jornal abaixo avisam e preparam a população para o início das obras.





 

6)      O PORTE DA OBRA

A notícia abaixo indica o porte da obra e as medidas da galeria do rio Berquó. São medidas internas. Não é citada a linha de esgoto que seria construída em paralelo à galeria.

 

7)      AS FASES DA OBRA

O mapa abaixo mostra as três fases da obra. A CINCO se encarregou da primeira e da segunda fases. A terceira atrasou bastante, não sendo completada durante o governo Carlos Lacerda e sim no de Negrão de Lima. O motivo desse atraso era a dificuldade de atravessar todas as pistas da Praia de Botafogo e da Avenida das Nações Unidas, não só pelo tráfego como também pela existência de linhas subterrâneas de esgoto, águas pluviais, eletricidade, gás e até cabos dos Correios.

Em decorrência disso, a fase três só terminou em 1967.

Eu particularmente não sei dizer se foi a CINCO a responsável por essa terceira fase, pois nessa época eu já estava alocado em Belém do Pará.


A primeira fase foi ao longo da rua Mena Barreto, iniciando na esquina da rua Dezenove de Fevereiro e terminando na Real Grandeza. Quando ingressei na CINCO os trabalhos se encontravam nesse estágio inicial, tendo chegado apenas até a esquina da rua Paulo Barreto.

Ao mesmo tempo prosseguiam as desapropriações e demolições necessárias ao longo do percurso até a Praia de Botafogo, dando origem mais tarde à rua Professor Álvaro Rodrigues.

A segunda fase foi tanto ao longo da rua Visconde Silva quanto da futura Professor Álvaro Rodrigues, simultaneamente.

A terceira fase foi a difícil travessia das pistas de tráfego da Praia de Botafogo e Avenida das Nações Unidas, até atingir a enseada de Botafogo.

 

8)        AS DESAPROPRIAÇÕES

Para as duas galerias (águas pluviais e esgoto sanitário) prosseguirem até a Praia de Botafogo, fez-se necessário desapropriar e demolir várias construções nesse caminho, tanto comerciais como residenciais. A notícia abaixo retrata isso.


Até mesmo um hospital de bonecas, situado no número 30 da rua da Passagem, foi desapropriado.



Os moradores se conformavam com o fato, em prol do bem do bairro, mas estavam preocupados quanto para onde ir.


Carlos Lacerda, ao ler a notícia da desapropriação do hospital de bonecas, marcou um encontro com o dono, Sr. Adelino Fernandes de Paula, e disponibilizou para ele um próprio estadual para instalação do hospital, pagando o mesmo aluguel. Por acaso o Sr. Adelino já tinha consertado bonecas a pedido do Carlos Lacerda e disse que dali em diante o faria de graça para ele.

 

9)      ANDAMENTO DAS OBRAS

Os anúncios abaixo se referem a contratação de mão de obra especializada. Aqui estão colocados para servir de gancho a comentários que farei pós-publicação desta matéria no SDR.



A foto abaixo mostra um momento de concretagem da laje da galeria de águas pluviais, em local que não consigo identificar. Observem a malha de ferragem usada na galeria. O armador era o Amado (ou seria Amaro?), um senhor com pinta de italiano, baixotinho e gordinho, mas excelente profissional.

Observem que toda a largura da rua era ocupada pelas escavações.

OBS: A palavra “armador” tem vários significados. No contexto das obras aqui descritas, armador é o profissional que faz a malha de ferragem para uma construção. Em São Paulo esse tipo de profissional é chamado de ferreiro, pois lá armador é quem decora câmaras mortuárias ou realiza funerais. 

 

10)   CONCLUSÃO DAS FASES 1 E 2

No dia 28/09/1965 essas fases foram dadas por encerradas. Autoridades estaduais fizeram visita ao canteiro de obras e houve solenidades. Lembrando que ainda faltava a fase 3, já citada antes.

A foto abaixo mostra a galeria de águas pluviais, no seu trecho de maiores dimensões. A largura interna era de 5,50m e a externa era 6,20m. A altura interna na linha d’água era de 1,85m mas externamente do topo à base era de 2,50m.

Infelizmente só localizei um jornal na Biblioteca Nacional que reproduziu a foto, e a qualidade dela é muito ruim. Mas antes isso do que nada.

O Aero-Willys e o Dauphine eram do engenheiro-chefe da obra, doutor Benjamim, paulista da cidade de Ipauçu. A Kombi e o fusca eram da companhia.

Se bem me lembro, houve um ensaio antes, no qual a Kombi também estava dentro da galeria, não me lembro se com o Dauphine ou com o fusca. Não havia carros na laje. Mas ficou muito apertado.

Essa foto foi tirada bem antes do término das obras mas foi reservada para só ser divulgada ao fim dos trabalhos.

Abaixo a parte inferior do mesmo anúncio em que foi veiculada a foto anterior.

 

11)    A INAUGURAÇÃO

A foto abaixo mostra o anúncio da inauguração da nova rua Mena Barreto, embora posteriormente a parte dela que foi estendida fosse renomeada para Professor Álvaro Rodrigues.


Flexa Ribeiro, candidato a sucessor de Carlos Lacerda, manifestou sua alegria com a inauguração da obra.

 

12)    O PÓS-OBRA

Conforme citei antes, a fase 3 demorou a ser concluída e não sei se o foi pela CINCO, pois estive alocado em vários canteiros após 1965, como em Copacabana, Maria da Graça, Higienópolis, Largo do Tanque, Fundão, Largo do Bicão, Rio Comprido, Recife, Acari, Belém, Honório Gurgel.

E foi em Honório Gurgel, no dia 28/02/1970, que recebemos a triste notícia da falência da companhia.

Escrevendo estas linhas, até me emociono e entristeço. A CINCO foi meu primeiro emprego e o único em que me senti útil para as pessoas. Foram seis anos e nove meses na empresa. Comecei aos 17 anos, saí aos 23.

Daquele dia em diante passei por várias empresas e cargos, porém não sinto que fiz nada promovedor de melhoria de vida para as pessoas. Há profissões em que você propicia isso a elas; em outras, fica neutro; e em outras mais, as prejudica.

Trabalhei quase 44 anos em Informática. É uma área que tende a facilitar a vida das pessoas, mas não a melhorar a vida delas. E dependendo do caso, só serve para complicar as coisas. 

Por hoje é só. 

***  FIM DA POSTAGEM  ***


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